A História dos Cariri. Pesquisadora: Rosi Kariri, presidente da Associação Indígena Kariri.

Apoio: Museu Histórico e Cultural de Jundiaí e Nucleo de Assuntos Indígena -SP, Fundação Nacional do Indio-FUNAI

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Características Físicas dos Tapuias

Os homens apresentavam-se corpulentos, possuidores de grande força física. A pele queimada, em tons de marrom. Usavam cabelo longo ao sabor do vento. Não costumavam usar roupas. Eram desprovidos de pêlos por todo o corpo. Apesar de andarem nus, cobriam as partes íntimas com peças feitas de materiais rudimentares, extraídos da natureza. Em contra partida, as mulheres apresentavam estrutura física pequena, mas a cor era a mesma da dos homens. Costumavam manter os cabelos curtos ou longos, de corpos rechonchudos. Também escondiam suas partes íntimas. Adornavam seu corpo com o que encontravam na natureza – Penas de aves, folhas de plantas nativas, raízes, utilizavam-se de pedaços de paus para fazerem brincos, colares e outros. Utilizavam-se de tais enfeites tanto para a prática das danças, como na preparação para a guerra.

 Rituais de Vida e Morte

Os Tapuias, por vezes, atingiam aproximadamente dois séculos de vida. Quando isso acontecia eram homenageados por sua tribo. Isto quando do sexo masculino - se do sexo feminino, ao darem à luz a mais de um filho, tornavam-se cativas. Estando doentes são visitados pelos amigos e se o caso de morte, matavam-nos para que não houvesse sofrimento. A causa mais freqüente de óbito entre os Tapuias era o veneno de cobra. Eram endocanibalistas, devoravam até mesmo os de sua tribo, quando da sua morte.

 A Vida Amorosa dos Tapuias

 A puberdade era o período em que a donzela estaria pronta para casar-se. A virgindade era bastante valorizada. O namoro, acontecia entre danças, onde eram escolhidos os pretendentes. No noivado, o pretendente oferecia presente ao sogro. Quando a donzela não arrumava pretendente, era levada ao rei e este a possuía.

 Os jovens tinham que demonstrar valor pessoal, exibindo força física. O rei aprovava a cerimônia e quando esta se realizava, furavam-se as faces dos noivos e colocavam pauzinhos. A festa durava cinco dias. Os matrimônios eram severos, apesar da poligamia, mas as cerimônias eram reservadas às primeiras esposas. Possuir várias mulheres era sinal de prestígio. O adultério era raro, e o marido expulsava a ré, depois de açoitá-la, no caso do flagrante e poderia matá-los. Sobre os tapuias cariris, eram praticantes do adultério, e era recíproco.

 Da Gravidez, do Parto e das Crianças

 A Índia, quando grávida, não tinha relações com o marido, também enquanto amamentava. A tapuia dava à luz nas matas, cozia o umbigo e a placenta e comia. Quando voltava ao acampamento, o filho era cuidado por outra mulher. Os maridos tinham o mesmo resguardo da parturiente. Esta se alimentavam de farinha de mandioca, milho, feijão, até o nascimento dos dentes dos lactentes. Os nascidos mortos eram devorados pelos tarairiús. As crianças começavam a andar com nove semanas e aprendiam a nadar nesta mesma época. Entre sete e oito anos eram furados o lábio inferior e as orelhas e colocados ossos e paus, depois eram batizados, ficando aptos para as lutas.

 Ferocidades, Armas e Lutas dos Tapuias

 Os Tapuias possuíam semblante ameaçador, corriam igual as feras, por isso eram muito temidos. Eram inconstantes, fáceis de ser levados a fazer o mal. Eram fortes, carregavam nos ombros grandes pesos. Ao irem para guerra, marchavam em silêncio, mas no embate faziam bastante alarido, jogando setas envenenadas das quais os feridos jamais escapavam.

Foram úteis, como aliados dos holandeses, conduzindo aos lugares mais difíceis. Os tapuias que se destacavam nas lutas eram considerados heróis. O poder real não era hereditário, este era substituído quando morto. O rei distinguia-se dos outros pelos cabelos e pelas unhas. Os tapuias eram muito obedientes ao rei.

Os tapuias se enfeitavam da cabeça aos pés para as lutas. Suas armas eram as flechas, as pranchetas, arcos e dardos, que usavam com grande habilidade. Usavam também as clavas e machados de mão; as armas eram enfeitadas com bonitas plumas. Eles não se utilizavam das armas de fogo, passaram a usar em razão da Guerra dos Bárbaros.

Das Habitações dos Tapuias

 Eram nômades, paravam onde houvesse abundância de alimentos. Gostavam de viver ao ar livre. Por isso não construíam casa, levantavam alguns ramos para servir de abrigo. Eram gulosos, as reservas alimentares dentro da área duravam somente dois ou três dias. Quando partem para outros sítios tocam fogo no acampamento.

 O rei era quem programava as atividades do dia e da noite. Antes de partirem, banhavam-se no rio, para espantar a moleza. Quando mudavam de acampamento, os mais fortes carregavam dois troncos de árvores. As mulheres e os meninos conduziam as armas, as bagagens e os trastes. Chegados ao local do novo acampamento, iam cortar árvores, e usavam os galhos e ramagens para fazerem sombra. As habitações dos tapuias eram toscas e feias.

 Caça, Pesca e Agricultura dos Tapuias

Os tapuias levavam uma vida descuidosa. Não semeavam, não plantavam, nem se esforçavam por coisa alguma. Alimentavam-se com mel de abelhas e maribondos e com todas as imundícies da terra, como cobras e lagartos. Os tapuias armavam ciladas aos peixes e animais, utilizando seu admirável olfato e sua habilidade para comer. Alimentavam-se ainda de frutos agrestes, caça fresca, peixes, tudo sem temperos ou condimentos. Não semeavam outra coisa além da mandioca.

 Para assar a carne, eles cavavam um buraco na terra e colocavam a carne, depois enterravam pondo folhas de árvores por cima e faziam uma fogueira por cima de tudo.

 Para atraírem felicidade na caça e pesca, os tapuias cariris queimavam ossos de animais ou espinhas de peixes.

 Os Jovens caçadores presenteavam os velhos da tribo com caças e pescarias, sem sequer comer um único pedaço. Durante o período de caça e pesca, comiam uma sopa muito rala, feita com farinha de milho ou mandioca. Depois dessa temporada, estavam magros, por razão do intenso trabalho e da alimentação inadequada.

 A Língua dos Tapuias

A linguagem era um tanto mal entendida, pois era trêmula, e cantada, não se entendia nada.

 Dezenas de palavras foram usadas na linguagem dos tapuias como por exemplo; carfa, caruatá, cayú, comatyn, corpamba, corraveara, cucuraí, ditre, entre outros.

As Aldeias Indígenas

 Foram aldeias, que em pouco tempo foram transformadas em vilas, onde existia um chefe para governar esse vilarejo indígena, onde estabeleceu-se a forma de vida um tanto democrática entre os demais. Podemos citar alguns nomes de aldeias existentes, como: a aldeia Jacoca, Utinga, Baía da traíção, Monte Mor da preguiça, Boa Vista, Cariris, Campina Grande, Brejo, Panatis, Coremas, Aldeia dos Pegas, dos Icos pequenos, etc.

 Religião dos Tapuias

 A religião dos Tapuias era basicamente animista, eles adoravam as forças da natureza com o trovão, a lua, o sol, além disto, acreditavam que certos animais, como serpentes, aves e alguns mamíferos, como morcegos, praticaram sacrifícios de animais, até humanos. Os europeus aqui chegados trataram de demonizar os deuses dos Tapuias, como podemos ver na frase do cronista Morisot, "Os brasilianos só adoram o diabo, não que daí esperem um bem, mas porque o temem, e por esse motivo oferecem sacrifícios e o invocam". (30, 125).

 Os Tapuias também tinham como Deus principal a Constelação da Ursa Maior, para eles um inimigo dos Tapuias o intrigou com o seu Deus, este era a raposa, a causadora de sua expulsão do paraíso. Os tapuias acreditavam na imortalidade da alma desde que a pessoa não tivesse morrido de morte matada ou de picada de serpente.

 Os Tapuias não faziam nada sem antes consultar os feiticeiros e adivinhos. De um modo geral, a religião dos tapuias lembra um pouco as religiões da África, no tocante a influência forte dos feiticeiros na vida indígena. Os europeus viam nos rituais dos tapuias um comércio direto com os poderes do inferno, além disto os tapuias possuíam deuses também que regiam a agricultura, a pesca e a caça, os invocaram e sacrificaram a eles para obter boas colheitas, pesca e caça fartas. Os tapuias tinham uma lenda que falava no Deus da criação, que tinham dois filhos, o mais novo foi embora para a terra, o Deus pai enviou seu filho mais velho para buscar seu filho mais novo, mas este e seus filhos acabaram maltratando e matando o irmão mais velho, que depois de morto ficou na terra, entre seus parentes, por vários dias e somente depois ascendem ao céu, retornando para o seu pai. Os europeus acreditavam que o Deus em quem os tapuias falavam era o Deus de Israel, o filho mais velho Jesus Cristo e o filho mais novo seria o próprio Lúcifer ou Caim.

 A Revolta liderada por Mandu Ladino 

Em 1693, com a descoberta das minas de ouro e diamantes em Minas Gerais, houve uma corrida para essa região. Muitos portugueses deixaram sua pátria para tentar a sorte no Brasil, outros partiram de São Paulo e da Bahia para fazer fortuna. De repente havia na região das Minas muitas bocas para comer.

Campos nas margens do rio das velhas na província de Minas Gerais. Rugendas (detalhe).

Com isso, as fazendas de gado se multiplicaram pelo interior para abastecer a grande população que ia para Minas. Baianos e portugueses foram invadindo as boas terras à beira do rio Parnaíba, no atual Estado do Piauí. Mais uma vez a expansão do gado trouxe consigo a expulsão das nações indígenas e a ocupação de suas terras.

Em 1712, no interior do Piauí, houve uma sublevação na fazenda de Antônio da Cunha Souto, morto pelos índios revoltados com a crueldade do fazendeiro. A revolta espalhou-se rapidamente por léguas e léguas: no Maranhão, no Piauí e no Ceará. Mandu Ladino, um índio batizado e educado pelos padres, liderou esse movimento com mão firme e tornou-se, por sete anos, o homem mais forte da região. Ele era da nação Kariri, mas muitos povos de língua tupi que moravam no Ceará juntaram-se a ele contra os fazendeiros. Foi uma importante rebelião, que abalou mais uma vez o sertão nordestino. Muitos portugueses morreram e muitas fazendas foram destruídas no Ceará e no Piauí.

Acontece que em Viçosa, no planalto da serra da Ibiapaba, os jesuítas haviam fundado uma grande aldeia cristã, onde moravam cerca de 10 mil indígenas. Os padres controlavam essa povoação, em que viviam predominantemente indígenas Tobajara de língua tupi. Aconselhados pelos padres e pelos portugueses da região, os Tobajara quebraram a força do movimento indígena unido. No ano de 1719, os fazendeiros organizaram uma grande expedição contra Mandu Ladino e seus guerreiros Kariri, conseguindo matá-los e ganhar a guerra.

Se o bom entendimento entre os povos de língua jê e tupi tivesse durado, os portugueses teriam perdido o Ceará, que poderia ter sido o primeiro Estado indígena em terras de Portugal, ou melhor, teria sido o primeiro território indígena que Portugal não conseguiu dominar.

Após essas derrotas, a quase totalidade dos índios do Nordeste foi ou escravizada ou confinada nos aldeamentos de missionários. Houve também grupos fugidos dos aldeamentos que vagavam pelo sertão. Apesar de massacrados e espoliados, os grupos remanescentes participaram de uma nova revolta, que envolveu os pobres do sertão e ficou conhecida como a Guerra dos Cabanos.

Os Kariri do São Francisco 

 Os Kariri viviam, como alguns grupos Tupi, em aldeias cercadas para evitar os ataques dos inimigos. Além do arco, da flecha, do machado de pedra, criaram o tsoncupy, uma lança feita de pau-brasil, cujas pontas terminavam em forma pontiaguda, e a azagaia, com qual lançavam pequenos dardos. Como afirmou um historiador, esses dardos eram lançados "com tal velocidade que não encontrando nenhum osso, atravessavam o corpo de um homem".

Tal como os Tupi, eram um povo dos rios. Além de serem habilidosos remadores, eram exímios nadadores. Desde a mais tenra idade a criança era jogada na água para aprender a nadar. Ao nascer, o menino era esfregado com a pele do porco-do-mato, animal protetor do grupo, e lavado com aluá, cauim feito de milho ou mandioca, para que no futuro fosse bom caçador e grande consumidor da bebida.

 Entre as entidades veneradas pelos Kariri destaca-se Nhinhó, criador do mundo e do povo Kariri; Badzé ou Padzu, deus da floresta e do fumo que teve dois filhos: Poditã, deus da caça, e Warakidzé, deus da chuva. Quem desrespeitasse essas entidades poderia receber um castigo de morte dado através do bisamu ou pajé. Um dos principais rituais era o do Warakidzã, que durava de três a quatro dias e ocorria na época do amadurecimento do coquinho do ouricuri, alimento preferido do porco-do-mato. Nessa ocasião, Warakidzé descia da estrela Orion, como "encantado", na figura de um jovem formoso, exigindo enfeites de penas e determinando a perfuração dos lábios dos adolescentes

 Confederação dos Cariris (Guerra dos Bárbaros)*

* Bárbaros - índios não Tupis, ou nativos que não falavam tupi-guarani - os índios de língua travada. Entenda-se por Cariris os Tapuias em geral. Pelo exposto, já é possível concluir que o mundo indígena findou-se com o avanço das fazendas de gado do branco colonizador (que assassinava os gentios, violentava-o sexualmente, usurpava as terras deste) e com a própria ação dos missionários católicos, os quais, na pretensão de catequizar o nativo, acabaram por destruir-lhe a cultura e o modo de viver.

 Um dos grandes exemplos da resistência indígena no Brasil deu-se com a chamada "Guerra dos Bárbaros" ou "Confederação dos Cariris", que durou cerca de 30 anos (1683 - 1713), na qual nativos do Rio Grande do Norte e principalmente do Ceará, e alguns de Pernambuco, Piauí e Parnaíba se uniram em uma confederação para enfrentar o conquistador branco.

 A presença dos paulistas não evitou que a guerra entre os brancos e os silvícolas confederados se dilatasse anos seguidos das fronteiras do Rio Grande do Norte ao interior do Ceará. Os Baiacus foram os mais terríveis e constantes inimigos dos colonizadores na zona do baixo Jaguaribe. No ano de 1713 a Confederação mostrou-se ainda viva na revolta geral desencadeada pelos Baiacus, Anacés, Jaguaribaras, Acriús, Canindés e Jenipapos, que forçaram os Tremembés a segui-los. A vila do Aquiraz, então sede da Capitania, foi inopinadamente atacada. Na sua defesa morreram 200 pessoas. O resto da população fugiu, defendendo-se como pode pelo caminho, que se semeou de mortos, indo acolher-se à proteção dos canhões da fortaleza de Nossa Senhora da Assunção na foz do Pajeú. Entrou então em ação o famoso regimento de ordenanças do coronel João de Barros Braga. Essa cavalaria, vestida de couro como os vaqueiros e composta de homens conhecedores do terreno em que pisavam, bem como do modo de guerrear dos indígenas, exterminou-se em violentíssima guerra de morte, que subiu pelo vale do Jaguaribe ao do Cariri e aos confins piauienses. Assim, acabou melancolicamente a terrível Confederação dos Cariris que durante 30 anos trouxe em sobressalto as gentes que iam povoando e civilizando as terras do Rio Grande do Norte e do Ceará.

 Os embates sangrentos dessa verdadeira guerra chegaram quase aos nossos dias. A tradição oral conservou por longo tempo a memória das crueldades e morticínios praticados no decurso das lutas, sobretudo das ações bárbaras dos índios a serviço dos contendores. Os únicos que sofreram alguma punição, foram os índios envolvidos no confronto, obrigados a deixar o Ceará (para não mais serem usados pelos coronéis). Os Montes, segundo registram os antigos historiadores, saíram da contenda empobrecidos e dizimados, enquanto os Feitosas continuaram fortes e a exercer seu poder nos anos seguintes. Nenhuma tribo resistiu às tentações da aguardente, às moléstias contagiosas, às brutalidades do colonizador. Em três séculos toda essa pobre gente emigrou, fugiu, desapareceu. O índio do Ceará foi desaparecendo misteriosamente, como sentindo que o seu tempo passara e eles se haviam tornado estrangeiros em sua própria terra. O sangue índio, embora diluído e fraco, corre ainda na veia dos matutos, dando-lhes com os traços fisionômicos, a coragem e a resignação da raça vencida.

Eles não desapareceram! Eles existem! Hoje, seus descendentes, como os Tremembés (em Almofala - Itarema), Os Genipapos e Canindés (em Lagoa da Encantada - Aquiraz), os Paiacus )em Aquiraz e Pacajus), os Pitagarys (em Maranguape), os Tabajaras (em Viçosa) e os Tapebas (estes originários do convívio entre Cariris, Potiguares e Tremembés em Caucaia) lutam pelo reconhecimento e preservação de sua identidade e patrimônio cultural, além de exigirem, com toda razão, a demarcação de terras historicamente a eles pertencentes. A resistência indígena continua!

 Confederação Cariri

 Para suas sesmarias e que viviam em coexistência pacifica com os indios Cariris que devido as suas curiosidades acabaram assimilando a norma de vida do branco, porém com a tirania do cativeiro posta em pratica pela necessidade do trabalho braçal e devido a especulação do mercador que via no indio um negocio rendoso acabou inconformando as tribos que por conta disto acabaram pegando em armas contra o invasor, na chamada Confederação dos Cariris numa luta que travaram de vida e morte e que durou mais de dez anos com extremos de desumanidade, onde o grupo Janduis inimigos tradicionais dos portugueses foi o mais aguerridos e que logo após após a expulsão dos holandeses haviam se refugiado em suas terras temerosos de uma possível vingança.